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Por Luiz Thadeu Nunes e Silva (*)

 

Após semana corrida, assoberbado de compromissos, fiquei o final de semana em casa. Não saí pra nada, nem para colocar o lixo na porta. Como não planejei ficar só, comi o que encontrei na geladeira. Roupa rota, gasta pelo tempo, já com a forma do corpo, foi a indumentária. Me permitir não fazer nada. Dormir até mais tarde, sem preocupação com as horas, que teimam em seguir em frente.

Chega um dia em que o tempo nos vira do avesso. Ando cansado, com sono irregular. Sigo em frente, aos trancos e barrancos, pela urgência dos afazeres.

Sinto-me enfadado, com vontade de tirar férias de mim. Como é impossível, tento desacelerar, à espera do que vem pela frente.

Ouvi um conselho, que tento colocar em prática, de vez em quando: “não caia na mentira moderna de que descansar é desperdiçar tempo. Não se engane pensando que estar improdutivo é estar parado para a vida”.

Aprendemos a viver correndo, marcando tarefas, cumprindo metas e buscando resultados visíveis. Cresci ouvindo: “Time is money” — velho chavão do mercado, ao se referir que tempo é dinheiro. No outono da vida, digo que tempo é vida. Rico mesmo é quem tem tempo para fazer o que gosta. Em especial as pequenas coisas.

Fomos treinados a acreditar que só somos valiosos quando estamos fazendo algo, mesmo que não tenha resultado. Mas esquecemos de algo essencial: o não fazer nada também é terapêutico, vital para a saúde.

Não fazer nada é, muitas vezes, a coisa mais importante que você pode fazer por si. É ali, no silêncio, no banho demorado, na leitura descompromissada ou na xícara de café sem pressa que você se reencontra. Que se reconecta consigo, à sua essência. Descansar, deixar fluir a preguiça do corpo é recarregar-se. É respirar. É preparar o corpo e a alma para continuar na labuta do dia a dia.

Não somos máquina programada para dar resultado. Não vim ao mundo para girar engrenagens sem fim. Ao contrário, sou humano, e me vejo cansado diante de tantos compromissos. Alguns sem serventia.

Diz o ditado popular: “quem aluga a bunda, não pode escolher hora e lugar para sentar”. Verdade! Tudo é premente e urgente.

Mas, enfim, consegui desacelerar no final de semana. Vi a chuva cair, sem precisar levantar da cama. Senti fome, que saciei com sobras. Não liguei a TV, que teima em vomitar tragédias, metendo-me medo. Fiquei longe das redes sociais, um refrigério para a cabeça. Pra que mesmo eu preciso de tanta informação? Para ter assunto para conversar? Para que conversar tanto?

Quebrando o silêncio, o canto alegre dos pássaros ao tomar água no bebedouro da janela; e bossa nova que programei na Alexa, minha companheira musical.

Como companhia alguns livros, de variados autores, postergados no corre-corre de tempos sem tempo.

Acreditem ou não! Mas o silêncio, longe de ser um estado de miséria ou abandono, pode ser um espaço de criação, de autodescoberta e de fortalecimento.  O silêncio não dá certezas, mas oferece maravilhamento. Além de trazer conforto, revela profundidade. E nisso reside sua beleza. É no interior do silêncio que encontro a força interior, a autonomia e a capacidade de definir meus próprios valores e propósitos.

O silêncio é, antes de mais nada, restaurador. Um descanso do cotidiano, dos deveres sociais, das máscaras que sou obrigado a vestir tantas vezes em público. Ele é necessário, para repousar, revigorar, reviver. Também tem o caráter profilático do silêncio, que impede que me perca em caminhos que não são meus. Sem ele, estaria perdido. De vez em quando silencio-me para fugir dos inconvenientes. Silencio-me para acalmar a mente e o espírito. A vida precisa de pausas, de recuos, de saídas. E o silêncio é uma delas. No silêncio me conecto com Deus. No silêncio me resgato.

Uma das grandes maravilhas de envelhecer é descobrir a requintada arte de estar sozinho. O que antes era um silêncio desconfortável, agora é um luxo. Às vezes me aquieto no meu canto. Não por preguiça, nem por covardia e nem para não sair da minha zona de conforto. Mas, para aquietar meu coração, acalmar a minha alma e a minha mente, às vezes, tão barulhenta.

Final de domingo, casa tranquila, inundada pela bela canção “Tarde em Itapuã”, na voz de Maria Bethânia; uma taça de vinho. O sol se recolheu dando lugar ao luar, avisando que logo mais é segunda-feira, tempo de retornar às obrigações.

 

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Luiz Thadeu Nunes

Engenheiro Agrônomo, escritor e globetrotter. Autor do livro “Das muletas fiz asas". E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br

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